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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Todos a pagar os impostos dos mais ricos


"Ao mesmo tempo que fecha Portugal a toda uma jovem geração qualificada e a empurra para a emigração, o Governo abre as portas a imigrantes endinheirados que não querem pagar impostos nos seus países. Estamos a falar de vistos gold e do "regime fiscal dos residentes não habituais".

Estes regimes de privilégio permitem que os novos imigrantes endinheirados se estabeleçam em Portugal, ou finjam estabelecer-se. E, assim, passem a pagar no nosso país impostos inferiores, não só aos que pagariam nos seus países, como aos que os portugueses com rendimentos similares pagam em Portugal. [...] não é por essa entrada imediata de dinheiro poder ser útil que o regime de privilégio deixa de ser moralmente repugnante. Por que razão deve um imigrante endinheirado pagar a mesma taxa de imposto, ou uma taxa ainda menor, que qualquer outro imigrante ou qualquer português?

Por outro lado, quando observamos as relações entre os países e as sociedades, este regime de privilégio surge-nos estúpido. Assim como Portugal, outros países da União Europeia (UE) estão a tentar atrair capitais de forma semelhante - Malta, Espanha, Bélgica e Reino Unido, etc. Isto significa que ao mesmo tempo que os ricos desses e de outros países escolhem Portugal como paraíso fiscal, os ricos portugueses podem refugiar-se em paraísos concorrentes. Temos, então, uma Europa em que cada país troca os seus ricos pelos ricos do parceiro em detrimento de todos. O povo paga para que ricos possam gozar de privilégios fiscais. Isto faz algum sentido? [...]

Muitas vezes os grandes desastres nas sociedades humanas parecem--nos loucura, mas acontecem. Designadamente, quando impera a lógica de colocar todos contra todos em benefício de meia dúzia.  

Em alternativa a esta injustiça, a UE poderia substituir a concorrência fiscal pela criação de um regime fiscal verdadeiramente harmonizado. Poderia e isso significaria "mais Europa". Mas a imposição do capitalismo neoliberal não permite essa via. Os poderes dominantes nesta UE conseguem harmonizar tudo o que seja importante para a liberdade de circulação de capitais e mercadorias, para enriquecer os mais ricos. Mas jamais harmonizam regras básicas, com sentido de progresso, digam elas respeito à fiscalidade ou à garantia de direitos sociais e, muito menos, se disserem respeito aos direitos no trabalho. 

É por estas e por outras que a UE está a deixar de significar, para cada vez mais europeus (e não-europeus), uma promessa de cooperação e progresso, para se transformar numa perigosa ameaça aos direitos, à dignidade e à prosperidade. E por extensão à própria paz, arrastando, no caminho da borrasca, a destruição da democracia."

Manuel Carvalho da Silva (sociólogo, ex-Secretário-Geral da CGTP-IN)

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