«Na verdade, os governos europeus, independentemente da sua cor política, parecem sentir-se mais mandatados para defender os direitos inalienáveis dos mercados do que os dos cidadãos. Com os primeiros têm compromissos sérios, que não podem deixar de honrar; com os segundos têm combinações frouxas, que podem substituir pela imposição de duríssimos sacrifícios. Só assim se explica que tais governos se tenham posto em sintonia para congelar e cortar salários, pensões e a generalidade das prestações sociais; para utilizar a pressão de um desemprego duradouramente acima dos 10% de modo a nivelar por baixo os direitos laborais; e para promover um aumento das desigualdades socioeconómicas e uma degradação dos serviços públicos, ameaçando fazer colapsar o Estado social.
O regime democrático, de que o Estado social é um dos pilares fundamentais, encontra-se sempre ameaçado quando as políticas salariais, fiscais e de acesso aos serviços públicos fundamentais não são suficientemente universais nem redistributivas para reduzirem o fosso das desigualdades socioeconómicas. Era já o que acontecia antes da crise em países como Portugal, um dos mais desiguais da Europa. Mas esta resposta à crise veio juntar-lhe um outro fosso, que põe em perigo as bases políticas de qualquer democracia, que é o fosso entre as políticas implantadas e os programas políticos com que os governos foram eleitos. Também neste aspecto, o caso português é um exemplo flagrante dessa dissociação, a qual encerra um forte potencial corrosivo das próprias bases em que assenta a representação democrática, como expressão da vontade dos cidadãos.
(...)
O novo regime que está a ser imposto como inevitável na União Europeia, e que bem se pode chamar regime «austeritário», representa uma séria ameaça para o contrato político, económico e social em que se fundamenta a democracia.»
Sandra Monteiro
1 comentário:
Que grande foto ! abraço dalaiama !
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