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terça-feira, 7 de outubro de 2014

Mais de 100 mil obrigados a trabalhar sem salário

Arte em cartazes de Eusboço (Crew L)

"As relações laborais atípicas têm vindo a recrudescer ao longo dos últimos anos, seja através do recurso a empresas de trabalho temporário, falsos recibos verdes, estágios ou trabalho não declarado. À medida que a emigração atinge números inéditos e que o desemprego afeta mais de um milhão de trabalhadores, as condições para a opressão de quem trabalha intensificam-se também. É neste contexto que os contratos de emprego inserção se estão a disseminar, atingindo já mais de 100 mil pessoas (que apesar de desempregadas não contam para as estatísticas do desemprego).

As medidas que obrigam pessoas desempregadas a trabalhar foram conhecidas durante vários anos como Programa Ocupacional de Emprego (POC), sendo o seu nome mais recente Contrato de Emprego Inserção (CEI) – quando destinado a pessoas que recebem subsídio de desemprego – e Contratos de Emprego Inserção+ (CEI+), quando os destinatários são pessoas que recebem o rendimento social de inserção (RSI).

O funcionamento destes programas é, em traços gerais, o seguinte: [...] podem candidatar-se a receber estes trabalhadores as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e os serviços públicos do Estado, devendo para tal manifestar o seu interesse junto do IEFP. Posto isto, o IEFP contacta as pessoas inscritas no Centro de Emprego que considera adequadas e escolhe uma pessoa que tem obrigatoriamente que aceitar a colocação no CEI ou CEI+ sob pena de perder o subsídio de desemprego ou o RSI.

De acordo com a legislação em vigor, os CEI e CEI+ não deveriam ocupar postos de trabalho, mas é por demais evidente que não é isso que acontece. Na verdade, há diversas funções do setor público que são asseguradas graças aos CEI e CEI+, como sejam os auxiliares de ação educativa nas escolas, sendo por demais evidente que esta se trata de uma função permanente e que, portanto, estas pessoas deveriam ser contratadas. O mesmo se passa nas IPSS que recorrem por demais a CEI e CEI+ para assegurarem funções inerentes a estas instituições, escusando-se assim a pagar um salário a trabalhadores.

Ora, as pessoas contratadas através de CEI e CEI+ são extremamente interessantes para as entidades contratantes uma vez que elas significam trabalho quase gratuito e quase sem direitos. De facto, a entidade contratante tem apenas que pagar o subsídio de transporte e de alimentação e uma pequeníssima parte da bolsa mensal que o trabalhador recebe.

[...]

Perante o exposto se constata que para a entidade patronal esta medida só apresenta vantagens, uma vez que quase nada tem que pagar por um trabalhador a tempo inteiro, trabalhador este que, formalmente, é um desempregado a exercer funções socialmente úteis e que portanto não tem direitos laborais.

Neste cenário, criam-se naturalmente expectativas junto das pessoas desempregadas que esperam poderem ser empregadas por estas instituições, o que nunca acontece não só porque essa não é a intenção de fundo como também porque há um batalhão de pessoas desempregadas prontas a serem obrigadas a trabalhar de graça quando aquele CEI for embora."

Cristina Andrade

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