«Quando chegar o dia 5 de Junho, os cidadãos portugueses vão ser chamados a eleger o poder legislativo. Mas, salvo qualquer surpresa, o verdadeiro poder de legislar terá já sido entregue, por vários anos, ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF).
Uma delas é que, se é certo que o plano para Portugal vai ser mais duro do que noutros países da União Europeia, isso acontece porque o FMI/FEEF devia ter sido chamado mais cedo. É claro que, se tivesse sido chamado mais cedo, o argumento mostraria a sua plasticidade: para funcionar, basta que a culpa seja sempre do que aconteceu antes do início da intervenção externa.
Uma outra ideia é a de que a recapitalização do sistema bancário é fundamental para a revitalização da economia e que é por isso que o sector ficará com uma parte significativa, a seguir ao pagamento da dívida, da «ajuda» a conceder. Pouco importa, portanto, que tenha sido o sistema financeiro a ter originado a crise e que, passados quatro anos, continue a não se fazer rigorosamente nada para a sua reforma e regulação. O que é preciso é conseguir impor todos os sacrifícios aos contribuintes para alimentar chorudos lucros bancários, se possível conseguindo a proeza de não ter de ouvir ninguém chamar a esse resgate uma «ajuda interna» − na verdade, ela é praticada pelos Estados, através dos contribuintes, e é destinada a salvar o sistema financeiro.
Outra ainda é a ideia de que o Estado social é necessariamente «gordo», «monstruoso», «ineficaz», precisando por isso de uma cura que o torne «ágil» e «moderno»… mas não se pode dizer muito sobre cada uma das reformas sem estudar tudo muito bem, pois elas podem ser duras para alguns sectores. É certo que estas ideias e medidas, puramente ideológicas, esquecem qualquer consideração crítica ou evidência empírica sobre uma pretensa maior eficiência dos privados. É certo também que ignoram de forma consciente o papel central que a associação entre fiscalidade progressiva e serviços públicos, que devem ser universais e gratuitos, desempenha na lógica subjacente ao contrato social em que assentam as democracias. Mas, mais do que isso, estas ideias encobrem o que está de facto em curso, aliás há várias décadas, e que é um programa de contínua extensão do projecto neoliberal, no quadro do qual a disputa do Estado (não o seu desaparecimento) e a apropriação dos recursos públicos são peças centrais para a formação dos lucros das grandes empresas e para a alimentação de todos os rentismos.
Uma última ideia é a de que a «ajuda» não vai ter grandes resultados ao nível da diminuição do desemprego ou da recuperação da economia e que se calhar também não vai permitir resolver o problema do pagamento da dívida, apesar de teoricamente ser esse o objectivo de quem «chamou» o FMI/FEEF. Mas também, apressam-se a acrescentar, tendo o pedido chegado tão tarde, tendo o país um sistema bancário tão descapitalizado e um Estado social tão «gordo»… não esperavam milagres, não é? Pois, milagres não. Só seria de esperar que não se cometesse o erro brutal de, num país há muito devastado por crescentes desigualdades e desprotecções sociais, e cada vez mais condenado por uma União Europeia que despreza a coesão entre os seus membros, não se piorasse a situação da esmagadora maioria dos cidadãos recorrendo a ajudas que matam.»
(...)
o choque neoliberal, apesar da sua retórica salvítica, é desastroso para as economias e para as sociedades. (...) Ao que se junta a conivência de uma comunicação social que está mais atenta ao «pluralismo de opiniões» dentro da famosa troika do que dentro da sociedade. Eis algumas dessas ideias e receitas que são repetidas à saciedade.
Uma delas é que, se é certo que o plano para Portugal vai ser mais duro do que noutros países da União Europeia, isso acontece porque o FMI/FEEF devia ter sido chamado mais cedo. É claro que, se tivesse sido chamado mais cedo, o argumento mostraria a sua plasticidade: para funcionar, basta que a culpa seja sempre do que aconteceu antes do início da intervenção externa.
Uma outra ideia é a de que a recapitalização do sistema bancário é fundamental para a revitalização da economia e que é por isso que o sector ficará com uma parte significativa, a seguir ao pagamento da dívida, da «ajuda» a conceder. Pouco importa, portanto, que tenha sido o sistema financeiro a ter originado a crise e que, passados quatro anos, continue a não se fazer rigorosamente nada para a sua reforma e regulação. O que é preciso é conseguir impor todos os sacrifícios aos contribuintes para alimentar chorudos lucros bancários, se possível conseguindo a proeza de não ter de ouvir ninguém chamar a esse resgate uma «ajuda interna» − na verdade, ela é praticada pelos Estados, através dos contribuintes, e é destinada a salvar o sistema financeiro.
Outra ainda é a ideia de que o Estado social é necessariamente «gordo», «monstruoso», «ineficaz», precisando por isso de uma cura que o torne «ágil» e «moderno»… mas não se pode dizer muito sobre cada uma das reformas sem estudar tudo muito bem, pois elas podem ser duras para alguns sectores. É certo que estas ideias e medidas, puramente ideológicas, esquecem qualquer consideração crítica ou evidência empírica sobre uma pretensa maior eficiência dos privados. É certo também que ignoram de forma consciente o papel central que a associação entre fiscalidade progressiva e serviços públicos, que devem ser universais e gratuitos, desempenha na lógica subjacente ao contrato social em que assentam as democracias. Mas, mais do que isso, estas ideias encobrem o que está de facto em curso, aliás há várias décadas, e que é um programa de contínua extensão do projecto neoliberal, no quadro do qual a disputa do Estado (não o seu desaparecimento) e a apropriação dos recursos públicos são peças centrais para a formação dos lucros das grandes empresas e para a alimentação de todos os rentismos.
Uma última ideia é a de que a «ajuda» não vai ter grandes resultados ao nível da diminuição do desemprego ou da recuperação da economia e que se calhar também não vai permitir resolver o problema do pagamento da dívida, apesar de teoricamente ser esse o objectivo de quem «chamou» o FMI/FEEF. Mas também, apressam-se a acrescentar, tendo o pedido chegado tão tarde, tendo o país um sistema bancário tão descapitalizado e um Estado social tão «gordo»… não esperavam milagres, não é? Pois, milagres não. Só seria de esperar que não se cometesse o erro brutal de, num país há muito devastado por crescentes desigualdades e desprotecções sociais, e cada vez mais condenado por uma União Europeia que despreza a coesão entre os seus membros, não se piorasse a situação da esmagadora maioria dos cidadãos recorrendo a ajudas que matam.»
1 comentário:
o Dalaiama não pode acabar! =( não faças isso, please!
tempos difíceis se avizinham, mais ainda do que os já vivemos agora, bem sei...mas aquilo que tu fazes e mostras ao mundo não pode acabar!
aprendo muito com o que pões aqui, leva-me a pesquisar mais, a querer saber mais, és mais importante do que aquilo que pensas se calhar...continua a fazer o que fazes, porque o fazes tão bem...
da tua fiel seguidora,
B.
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