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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Two Lines of Birds


"Depois de ter andado muito tempo, [o jovem Han Fook] alcançou a nascente do rio e encontrou uma cabana de bambu, erguida em absoluto isolamento e, diante da cabana, sentado sobre um tapete de vime entrançado, o ancião que ele vira junto à margem do rio, perto da árvore. Estava sentado, tocava um alaúde, e quando viu o visitante aproximar-se respeitosamente, não se ergueu, nem o saudou; sorriu apenas e deixou os dedos macios correrem sobre as cordas, e uma música maravilhosa pairou sobre o vale como nuvem argêntea, de forma que o jovem se ergueu e quedou extasiado, e num doce encantamento esqueceu tudo o mais, até que o Mestre-da-Palavra-Perfeita pôs de lado o seu pequeno alaúde e entrou na cabana. Han Fook seguiu-o cheio de respeito, e permaneceu com ele, como seu servidor e seu discípulo.

Decorreu um mês, e ele aprendeu a desdenhar todas as canções que até então compusera, e baniu-as da sua memória. E novamente, transcorridos meses, extirpou também da memória as canções que aprendera com os seus professores na sua terra. O mestre mal trocava com ele alguma palavra; ensinava-lhe silenciosamente a arte de tanger o alaúde, até que o Ser do discípulo ficou completamente impregnado de música. Certa vez, Han Fook compôs um pequeno poema, onde descreveu o vôo de dois pássaros no céu primaveril, o qual muito lhe agradou. Não ousou mostrá-lo ao mestre, mas uma tarde cantou-o, próximo da cabana, e o mestre ouviu-o atentamente, contudo não pronunciou palavra alguma. Apenas tangeu suavemente o seu alaúde, e imediatamente o ar arrefeceu, o crepúsculo abreviou-se, um vento forte ergueu-se, apesar de ser pleno verão, e no céu já escuro perpassaram duas garças, sumptuosas nos seus volteios, num poderoso desejo de emigração; tudo isto era tão mais belo e perfeito que os versos do discípulo, que este entristeceu, e silenciou, sentindo-se inapto."

Hermann Hesse (1914) [adaptado de uma tradução de Isabel de Almeida e Sousa]


"When he had traveled for a very long time, he reached the source of the river and found a bamboo hut standing by itself in the wilderness. On a braided mat in front of the hut sat the old man whom Han Fook had seen on the bank by the tree trunk. The old man sat and played his lute, and when he saw the guest approach respectfully, he did not get up, nor did he greet him. He only smiled and let his sensitive fingers play over the strings. A magic music flowed like a silver cloud through the valley, so that the young man stood in wondering astonishment and forgot everything else until the Master of the Perfect Word put aside his small lute and stepped into his hut. So Han Fook followed him with awe and remained with him as his servant and pupil. 

A month passed, and Han Fook had learned to despise all poems which he had written before. He erased them from his memory. And after a few more months he erased even those poems from his memory which he had learned from his teachers at home. The Master spoke hardly a word with him. Silently, he taught Han Fook the art of lute playing until the very being of the pupil was filled with music. Once Han Fook composed a small poem, in which he described the flight of two birds across the autumnal sky, a poem which pleased him quite well. He didn’t dare show it to the Master, but one evening he sang it near the hut. The Master heard it well but said not a word. He only played softly on his lute. Immediately the air became cool and the darkness increased; a sharp wind arose even though it was the middle of summer. Across the sky, which had now become gray, flew two lines of birds in their mighty yearning for new lands. All of this was so much more beautiful and perfect than the verses of the pupil, that Han Fook became sad and silent, and felt himself worthless."

Hermann Hesse (1914) [translated by Denver Lindley]


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