segunda-feira, 28 de abril de 2014
Variações na história da pintura automóvel
"[...] salientar algumas grandes tendências na história das carroçarias das viaturas automóveis, desde o seu aparecimento, no final do século XIX. Podem-se mesmo distinguir, grosseiramente, três períodos. Desde as origens até ao final da Segunda Guerra Mundial, os automóveis eram, na sua maioria, quer pretos ou cinzentos, quer brancos ou creme, sendo a ausência de «verdadeira» cor devida, não a questões técnicas, ligadas à química industrial dos corantes, mas antes a considerações de moral social. Filho do capitalismo e da sociedade industrial, o carro devia, nos seus começos -- como muitos outros objetos e produtos -- apresentar cores discretas, honestas, dignas de cidadãos respeitáveis e de cristãos virtuosos (pensemos aqui no grande Henry Ford, fundador da dinastia, que por puritanismo não queria vender senão carros pretos). A partir dos anos cinquenta e até meados dos anos setenta, a tendência inverte-se, os carros pretos ou brancos tornam-se mais raros, os carros «a cores», mais numerosos. Depois, durante uma quinzena de anos, o movimento do pêndulo parte para o outro sentido: a moda já não está nas cores vivas, mas nas cores sóbrias e sombrias, especialmente o cinzento. [...]
No interior destes ciclos de longa duração, colocam-se os ciclos de menor duração, muitas vezes limitados geograficamente. Mas, como sempre, estes movimentos pendulares caracterizam-se através de fenómenos de moda e de snobismo. Quando toda a gente tem um carro preto, é «muito chique» ter um carro vermelho ou amarelo. Quando toda a gente tem um carro de cor viva, o máximo dos máximos é ter um carro cinzento. [...] estes movimentos de inversão [...] dizem respeito tanto ao carro, como ao vestuário, tanto ao vestuário, como aos objetos da vida quotidiana, às capas dos livros e das revistas [...] obedecem a ritmos rápidos, perturbando, desse modo, totalmente as escalas de valores (e portanto as classificações sociais) construídas sobre a cor."
Michel Pastoureau
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